sábado, 26 de abril de 2008

As XX jornadas teológicas sob o ponto de vista de um vegetal com forma fálica, pouco juízo e pouco respeito pelo preço do gasóleo

Os vegetais estão na ordem do dia. Ora é o preço do trigo, ora é a soja que desfloresta forte e feio a Amazónia para criar carne para o McDonald's ou são cogumelos ou ervinhas recreativas na óptica do utilizador. A abobrinha não podia alhear-se desta dominância vegetal e antecipou a próxima tendência: a teologia. Para algo com uma forma fálica pode não ser apropriado, mas nada neste blogue é apropriado para absolutamente nada, pelo que faz estranhamente sentido.

Assim sendo, percorri uns quilómetros para ver as XX jornadas teológicas em Braga (isto e isto e isto). Fiel a mim mesma, perdi-me pelo caminho (os vegetais têm raizes, mas as rodas não são a nossa vocação), mas nada que me impedisse de chegar a um edifício amarelo grande de carago que se revelou a Faculdade de Teologia. Algo ali me fez lembrar Faculdade de Ciências, a Faculdade de Farmácia e a antiga Reitoria do Porto (hoje a Reitoria é onde era a Faculdade de Ciências). Com uma diferença: menos gajas.

Havia montes de gajos por lá. Pena que 80% deles tivessem cara de padres. E sim, existe uma coisa que se chama cara de padre e hoje até olhei para um deles quando fui tomar café. De facto esse estudou anos e anos para padre e estava com uma moça muito religiosa. Tão religiosa que casou com ele, no verdadeiro cumprimento do desígnio "um padre à cabeceira". Acho que ele não chegou a padre mesmo, mas da cara não se livra.

Por um momento cheguei a pensar que me tivesse enganado no sítio porque no slide de apresentação anunciava o Prof. Ludwing Krippahl. Mas seria coincidência a mais ter outra actividade com uma pessoa com um nome tão parecido no mesmo sítio e à mesma hora, pelo que assumi que seria uma gralha! E era mesmo! O auditório encheu e estariam aí umas 70-80 pessoas (mas eu sou má a fazer estimativas, pelo que aceito outro número). Em cima das cadeiras o resumo de 1 página do Ludwig, que é este texto, o que demonstra a transparência do que ele foi dizer. Do Jónatas Machado... nicles! Nem era preciso: quem lê as teorias do Perspectiva já sabe o que ele quer.

Para uma coisa anunciada às 21:00 h o pessoal não estava com grande pressa de começar. Se fosse um casamento já o noivo teria dado de frosques (e daí, já esperei 1 hora por um casamento, o que nem seria grave se não estivesse quase com uma queda de açúcar porque foi dos poucos dias que saí de casa sem tomar pequeno-almoço). Mas o que realmente estava a dar-me cabo dos nervos era a música de igreja.

Para dar início às hostilidades um mocinho com cara de padre, voz de padre e entoação de padre apresentou a iniciativa. Deixo à vossa consideração a expressão "mui valoroso" e à vossa imaginação as caras que eu fiz quando ouvi isso e de quantas maneiras tive que disfarçar o riso.

O Ludwig foi apresentado como "evolucionista radical" (falso) e o Jónatas Machado como "criacionista radical" e seguiu-se meia hora de apresentação para cada lado, com a ameaça/promessa de ser rigorosamente cronometrada.

A apresentação do Ludwig está aqui e foi excelente: clara, sucinta, desfazia pensamentos peregrinos como teoria da evolução ser darwinismo (onde o darwinismo já vai!) e a ideia de a teoria da evolução ser só baseada em fósseis. Gostei! E chamo a atenção para o facto de o Ludwig, em mais uma demonstração de transparência, ter disponibilizado a sua apresentação, estando sujeito a ser criticado. Claro que "Essa deve ser das piores apresentações que já vi. Com defensores destes, a evolução não precisa de criacionistas para nada. E as imprecisões e incorrecções seguem-se umas atrás das outras. Enfim, vê-se que não está por dentro do assunto.Já para não mencionar o facto de que parece que está a falar para uma audiência de anormaizinhos. Nem a minha professora do secundário..." (de um anónimo às 23:54 de 26 de Abril) como crítica não conta.

A apresentação do Jónatas Machado pareceu estranhamente mais longa, o que é um disparate, dado que foram ambas rigorosamente cronometradas. Mas foi mais densa. O que ele apresentou foi a "doutrina bíblica de criação" (diz ele). Os apontamentos que tirei são estranhos porque comecei com paciência e acabei com impaciência. Começou por ser uma apresentação de teologia (a palavra de Deus é verdadeira, infalível, etc), mas acho que meteu água quando citou Popper e disse que este considerava que a Ciência o era quando era falsificável. Não tenho conhecimentos para refutar isto, mas parece-me uma interpretação abusiva.

A lição de teologia evoluiu para um ataque à Ciência, com disparates como dizer que a Ciência se quer sobrepor a Deus, que no naturalismo não existe um padrão objectivo de moralidade, que há um diferenciação qualitativa entre homens e animais (e qual é ela?) e por aí adiante. Ainda disse um disparate total que foi a expressão "fé naturalista" e o famoso "ninguém viu, ninguém estava lá, só Deus" na criação do Universo. Outro disparate: "os factos não falam por si, eles são interpretados". E o disparate supremo: a Biologia confirma a Bíblia.

A isto se seguiu uma entediante apresentação de factóides distorcidos, como a formação rapidíssima de acidentes geológicos (chama-se actividade vulcânica, doutor), e a treta da semana: a fossilização à la minute. Recomendo a leitura desse post do Ludwig e a das respectivas referências, porque é uma treta a que recorre frequentemente o Jónatas Machado. Suponho que não voltará a ela (mas nunca se sabe!). Quanto à minha impressão da discussão em si, remeto para a leitura dos meus comentários a este post, onde ainda se pode ler a visão do Leandro (que também lá esteve).

Confesso que estive para dizer que não tinha ido. Aliás, era a minha firme intenção... até que li que o Ludwig tinha dito que tinha achado que tinha corrido bem! Não foi essa a minha percepção e tinha mesmo que lho dizer! Chamo ainda a atenção para o facto de que tenho razão quando digo que há jogos de palavras mais que jogos de factos: há uma tentativa de fazer o Jónatas Machado cantar vitória do debate nesta caixa de comentários, o que não é verdade. De facto, dados os comentários a esse post, só uma imaginação delirante acharia isso (e eu tenho uma grande imaginação e não fui capaz de pensar isso).

O debate em si soube a muito pouco, foi mal moderado e o Jónatas Machado tentou monopolizar o tempo. Foi igualzinho ao Perspectiva (mesmo porque é ele, sem tirar nem por), sempre cheio de "factos" e recorria aos slides para ilustrá-los. Irritante! Há quem pense que isso o descredibilizou e até é mais ou menos verdade... mas deu-lhe visibilidade, o que é perigoso!

O debate foi interrompido abruptamente com um rigor no cumprimento de horários que não existiu para iniciar e quando uma discussão interessante se estava a formar. Soube a pouco. Soube a muito pouco!

No final parece que houve uma confraternização, mas eu tinha que fugir antes que o meu coche se transformasse em abóbora.

Gostei e não dei o tempo nem o gasóleo por mal empregues. Mas espero ter contribuído com a minha visão do que se passou em Braga para que o Ludwig ganhe mais agressividade em debates futuros. Mas que os haja, porque é importante discutir estas coisas: só se pode combater o que se conhece. E o criacionismo bíblico é uma de muitas tendências de desinformação no mundo. Gostaria de dizer que é o único, mas não é.

5 comentários:

Rui leprechaun disse...
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
Ludwig Krippahl disse...

Abobrinha,

Eu penso que discordamos acerca de ter corrido bem ou mal por uma diferença de expectativas. Eu dou-me por satisfeito que as pessoas tenham visto o o que o criacionismo realmente é: tele-evangelismo, como disse o Leandro.

Abobrinha disse...

Ludwig

Se pensavas que os presentes pensavam que o criacionismo era outra coisa mais que tele-evangelismo, então quem tem um problema de expectativas és tu e pensei que não era o caso. No post em que primeiro apresentaste o debate todos (menos nós os dois) pareciam convencidos que os católicos (pela lógica a maioria da assistência) te seriam hostis. Do mesmo modo pensei que seria claro que a maioria teria abertura para o que irias dizer. Ou seja, que já saberias que eles têm a mesma opinião que o Leandro.

Ou seja, eu esperava que dissesses "treta" maia alto e mais claramente. O Alfredo Dinis disse, mas andou às voltas. Esperava que te opusesses ao Jónatas Machado mais frontalmente. Não precisavas de ter rebatido todos os factos um por um, só por não seres especialista: é que ele também não é... mas mente bem, o que tu não és capaz de fazer nem convém.

Para te demonstrar como cai facilmente um falso especialista, conto-te uma história que se passou comigo e com um amigo meu: ele é muito bom rapazinho e muito entendido na área dele (acho eu, mas não sei porque não percebo os pormenores da área dele). Tem um problema: acha que entende tudo de todas as áreas, o que eu tolero quando estou bem disposta e pico quando não estou para o aturar e me apetece uma bulhazinha (e porque não estou para massajar o já enorme ego dele).

Esse meu amigo cometeu o erro de se meter um pouquinho na minha área. Eu sei que pouco sei (há sempre muito mais para saber e eu tenho essa noção), mas eu sei mais que ele e não admito que me ponham em causa em algo que eu sei com mais segurança que ele. Palavra puxa palavra e ele começa a mandar postas de pescada em coisas que já não tinham NADA a ver. A dada altura sai a seguinte pérola:

"Estás maluca! Eu provo-te com as equações de (?????) que te podes desmaterializar aqui e materializar ali abaixo".

Ao que aqui a Abobrinha responde:

"Ai é? Então dá-me essas equações e eu provo-te exactamente o oposto. E sabes porquê? Porque eu percebo disso o mesmo que tu: NADA!!"

Dito isto, a minha curiosidade era ver como era o Jónatas ao vivo e a cores e se o Perspectiva tinha existência real. E tem. E é exactamente o que é no blogue: falso, enganador e que merece um pouco do seu próprio veneno. O jeito encantador dele é um perigo e olha que uma mulher é mais capaz de ver isso que um homem (olha a Palmira, que também não o pode ver nem pintado).

As críticas que te fiz não são para acatares (mesmo porque quem foi convidado para o debate foste tu e não eu), mas eu gostaria de mais agressividade e luta corpo-a-corpo num debate futuro (porque eles vão existir). Porque estás a tratá-lo como boa pessoa, como honesto e ele não é nem uma coisa nem outra. E tem que ser levado como é e não como tu pensas que ele é. De novo uma diferença de expectativas.

Estiveste bem, mas ele conseguiu sobrepor-se a ti. Dado o contexto, é um perigo porque pode ganhar credibilidade. Não naquela audiência mas noutra. De qualquer modo já viste como "eles" são especialistas em desinformação.

Ludwig Krippahl disse...

Abobrinha,

Admito que seria interessante um debate entre ti e o Jónatas. Ele saia de lá com os ouvidos cheios de certeza :)

Mas não concordo que a agressividade seja boa num debate deste género. Acho que o meu papel ali era principalmente mostrar que a ciência não é meia dúzia de tretas mas um edifício sólido bem fundamentado e para isso era importante não me embrenhar em detalhes onde a facilidade com que os criacionistas tiram patranhas da manga só me iria prejudicar...

Abobrinha disse...

Ludwig

Lá está: o convidado foste tu. Mas não foste suficientemente agressivo (a meu ver) em termos de argumentos.

Ele não sairia com os ouvidos cheios... mas não ia falar tanto porque eu não ia deixar: tenho um limite de tretas por unidade de tempo consigo suportar... estou a ficar velha!